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O crepúsculo dos protestos

As manifestações de Sete de Setembro não conseguiram repetir o êxito que tiveram em junho. E a estratégia de protestos de rua parece estar em declínio como alternativa para atuação política. A partir de julho, o movimento Black Bloc foi gradativamente tomando conta das manifestações e elas passaram a ficar marcadas pelo aumento da violência e depredações de patrimônio público e privado. Isso provocou uma debandada geral. Entretanto, os manifestantes de junho não precisam cair na frustração só porque o Brasil não mudou em um mês.

Na semana passada, a Câmara dos Deputados nos presenteou com o primeiro deputado-presidiário, Natan Donadon. Nesta semana, a Câmara e o Senado ficaram num jogo de empurra-empurra e jogaram para frente a votação do projeto do fim do voto secreto. Cientes de que o momento de crise já passou, os parlamentares não evitam comportamentos vergonhosos. As centenas de milhares de pessoas que foram às ruas em junho podem usar o seu tempo livre para mudar tudo aquilo que a classe política insiste em manter como está.

Não é preciso ir para a rua toda a semana. Dá para permanecer mobilizado, cobrando os parlamentares, mandando mensagens eletrônicas ou por fax, ligando para gabinetes, enviando cartas, fiscalizando a atuação dos eleitos. Dá para ingressar nos partidos e forçar uma mudança – aliás, "capturar" os partidos é uma estratégia inovadora que ainda ninguém tentou. Dá para também para fazer o acerto final no próximo ano, lembrando dos atuais políticos na hora de votar. Reflita e envie sua mensagem, o que você está disposto a fazer?

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O bilionário americano Bernard "Bernie" Madoff, conhecido filantropo da comunidade judaica de Nova York, foi preso em 2009 por fraude financeira que resultou prejuízos de investidores avaliados em US$ 65 bilhões. Em apenas oito meses, Madoff foi denunciado, julgado, condenado e preso. A pena é de 150 anos de cadeia. Não há notícias de que os cidadãos e os juristas dos Estados Unidos considerem que o julgamento foi injusto, ou que Madoff tenha tido seu direito de defesa violado. O julgamento do mensalão dura sete anos e, se os embargos infringentes vierem a ser aceitos, pode adentrar 2014 sem um desfecho.

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De um lado a comparação é forçada. A denúncia do mensalão tinha 40 réus, o que dá um trabalho enorme de ouvir mais de seiscentas testemunhas, examinar provas e cumprir todos os prazos e requisitos necessários para evitar a violação do direito dos réus. De outro, não dá para negar que a Justiça dos Estados Unidos é pautada pela necessidade de o processo penal ser eficaz. Sem que haja dúvidas da legalidade do processo, as ações penais tramitam rapidamente.

No Brasil, se dá pouca importância a isso principalmente quando há autoridades envolvidas. A prescrição – a perda do direito do Estado pretender punir alguém – tem sido aliada de autoridades processadas no Supremo Tribunal Federal. Em 2010, o então deputado federal Cássio Taniguchi (DEM), atual secretário de Estado de Planejamento, foi condenado a duas penas de três meses de detenção pela prática de crimes de responsabilidade. Mas, como a pena estava prescrita, teve extinta a punibilidade.

Tornar o processo penal brasileiro eficiente é algo possível de se fazer sem violar as garantias constitucionais de direito ao contraditório, ampla defesa e devido processo legal. Um processo eficiente permite que esses direitos sejam resguardados. Mas é também um processo que permite a punição em tempo razoável, a fim de evitar a prescrição.

Os embargos infringentes do STF podem ser suprimidos e os dispositivos de prescrição podem ser alterados para garantir a eficácia. É possível acabar, por exemplo, com a "prescrição da pena em concreto" – que ocorre a partir do número de anos de punição estabelecido pelo juiz. Essas são apenas algumas das medidas que resolveriam parte dos problemas de eficácia no julgamento de autoridades públicas.

Se a eficácia e a eficiência do processo penal brasileiro permanecerem esquecidas, as instituições brasileiras estarão realizando um projeto de justiça meramente literário. A punição de autoridades públicas será visto como uma ficção e continuará a alimentar a descrença nas instituições. Franz Kafka narrou a história de um condenado que não sabia os motivos de sua punição. O Brasil está próximo de distorcer a literatura de Kafka – admite-se a culpa dos réus, mas não é possível condená-los.

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