Oposição
Parlamento mais conservador exigirá de Dilma jogo de cintura
Amanda Audi
A presidente reeleita Dilma Rousseff (PT)enfrentará um Congresso mais fragmentado e com base aliada mais enxuta que o de quatro anos atrás. Para especialistas, o panorama indica que a petista terá que redobrar o jogo de cintura para fortalecer a base e evitar rachas. Com 304 deputados federais e 53 senadores, Dilma manterá maioria nas duas Casas. O que não será exatamente confortável: os congressistas de oposição ou que ainda não definiram apoio somam 209 na Câmara e 28 no Senado e podem ser um complicador para o governo dependendo das coalizões.
Com esses números, o governo federal não conseguiria aprovar uma emenda constitucional na Câmara, por exemplo, que demanda apoio de 60% dos deputados. Em 2010, a base de Dilma era de 395 deputados (ou 77% da Casa) e 60 senadores (74%). Os valores hoje ficam em 59% e 65%.
Cientistas políticos dizem que Dilma terá de dar atenção especial a partidos médios que cresceram na última eleição, como o PSC e o PSB. Além disso, o novo Congresso é mais conservador que o atual, o que renderá disputas voto a voto em situações polêmicas como o projeto que reduz a maioridade penal, que deve ser defendido pelos oposicionistas.
"Dilma não está tranquila e terá que pensar em como conquistar apoios. Ela deve ter cuidado para distribuir ministérios e cargos", diz a cientista política e professora da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar) Maria do Socorro Braga.
Emerson Cervi, da UFPR, lembra que partidos tradicionais da base também diminuíram proporcionalmente a bancada na última eleição. "Isso significa que vai ter que negociar com o Congresso de maneira diferente."
Calcanhar de Aquiles
Na nova configuração do Congresso, o PMDB segue sendo figura central. Em um cenário de diminuição das bancadas de partidos da base em relação à legislatura atual e de aumento de representação de legendas como o PSC e o PSB, Dilma deverá se esforçar para manter o gigante como aliado. Além disso, congressistas como Pedro Simon (no Senado) e Eduardo Cunha (na Câmara) cerraram fileiras com a oposição no primeiro mandato. "A governabilidade vai depender da capacidade de atrair o PMDB", resume o cientista político Emerson Cervi.
- Prometeu, tem que cumprir
- A trajetória de Dilma Rousseff
- Aécio Neves pede para Dilma unir o país
- Com Aécio, PSDB tem a maior votação da história
- Aécio vence Dilma nas dez principais cidades do Paraná
- Apesar de escândalos, PT governará com Dilma até o final de 2018
- Reeleição de Dilma é manchete do site do Financial Times
- Dilma é eleita com menor vantagem desde a redemocratização
- PT comemora, mas já inicia reflexão interna
- Lideranças do PR analisam resultado
- Novo governo recicla ideias já apresentadas
A vitória apertada de Dilma Rousseff (PT) vai colaborar para o aumento da tensão nas relações do Palácio do Planalto com o Congresso Nacional. Parlamentares ouvidos pela Gazeta do Povo preveem um cenário ainda mais complexo do que no primeiro mandato, quando a petista conseguiu formar uma maioria superior a 80% na Câmara dos Deputados e no Senado, mas manteve conflitos constantes com o Legislativo. A primeira dificuldade passa pelo racha na bancada do principal aliado, o PMDB.
INFOGRÁFICO: Veja a configuração do atual Congresso
Veja o resultado da apuração dos votos para presidente em todo Brasil
Veja o resultado da apuração dos votos para presidente no Paraná
Veja o resultado da apuração dos votos para presidente em Curitiba
Os peemedebistas construíram canais de diálogo diferentes com Dilma. No Senado, a situação foi amistosa, graças à aliança que garantiu a presidência da Casa a Renan Calheiros. Na Câmara, as rebeliões da ala do partido ligada ao carioca Eduardo Cunha, atual líder da bancada, contribuíram para emperrar votações de interesse do governo.
Cunha ajudou a costurar, por exemplo, o apoio dos tucanos à candidatura de Luiz Fernando Pezão ao governo do Rio de Janeiro. Também era cotado para assumir a presidência da Câmara no caso de uma vitória de Aécio Neves. "A gente sabia que o PMDB voltaria a dar as cartas, só não sabia com qual presidente da República", afirma o deputado paranaense João Arruda.
No primeiro mandato, as rebeliões caíram na conta do vice-presidente Michel Temer, presidente licenciado da legenda. Temer vai continuar como articulador do governo com o Congresso, mas com outra postura. O objetivo dele será unificar os peemedebistas para garantir estabilidade ao partido em 2018, quando planeja lançar candidato próprio ao Planalto (o próprio Temer seria um dos nomes).
Legendas médias da coligação de Dilma, como PSD e PP, também esperam por uma nova forma de fazer política com o Congresso. "Como a presidente passou por uma reeleição apertada, é natural que pare para pensar. E também é natural que ela mude de postura e fundamentalmente escolha melhores interlocutores", opina o deputado Ricardo Barros (PP-PR).
Líder dos governos Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e Lula (PT) na Câmara, o parlamentar diz que o aumento no número de partidos na Câmara de 22 para 28 vai fazer com que a negociação mude. "Não vai mais existir essa história de um mesmo partido ficar com quatro ou cinco ministérios."
A pulverização partidária causa temor entre petistas. Líder da bancada paranaense, o deputado Assis do Couto (PT) avalia que houve uma mudança de perfil entre os novos deputados. "Teremos uma Câmara muito mais conservadora. E o conservadorismo é irmão gêmeo do fisiologismo", afirma o petista.
Líder do PPS na Câmara, Rubens Bueno, diz que o legado do primeiro mandato será o entrave de Dilma, mais do que a relação com os parlamentares. "O que ela fez até agora foi desorganizar todo o modelo econômico do país. Sabemos que a conta disso tudo vem no ano que vem, mas o Congresso não tem como ajudar a organizar isso de uma hora para outra", cita Bueno.
Vice-líder do governo Dilma, o deputado Alex Canziani (PTB) complementa que a situação política do Legislativo, independentemente da presidente, também será turbulenta. "A operação Lava Jato [que investiga corrupção na Petrobras] só vai gerar os desdobramentos no ano que vem. Se houver mesmo a tal lista com 28 deputados e senadores envolvidos, vamos passar o ano votando cassações", diz o petebista.