Divergência entre Barbosa e Lewandowski volta a gerar bate-boca
Relator do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Joaquim Barbosa rebateu nesta quarta-feira (5) o revisor do caso, Ricardo Lewandowski, e afirmou que não é possível acreditar que a ex-diretora do Banco Rural Ayanna Tenório agiu com "candura".
No início da sessão, Lewandowski divergiu de Barbosa e votou pela absolvição de Ayanna e do vice-presidente da instituição Vinícius Samarane da acusação de crime de gestão fraudulenta.
A ex-presidente do Banco Rural, Kátia Rabello, e o ex-presidente José Roberto Salgado foram condenados nesta quarta-feira (5) pelo crime de gestão fraudulenta de instituição bancária pela maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do mensalão (Ação Penal 470). Segundo o entendimento da Corte, o Banco Rural fez empréstimos fictícios ao PT e às empresas do publicitário Marcos Valério, fato que a defesa dos réus nega e afirma que o repasse de R4 32 milhões efetivamente existiu.
As condenações complicam a situação do ex-presidente do PT José Genoino e do ex-tesoureiro da sigla Delúbio Soares, que tomaram R$ 3 milhões do Banco Rural para o PT em 2003. Acusados de formação de quadrilha e corrupção ativa, eles aguardam o julgamento no Supremo.
Os dois ex-executivos do Rural foram condenados pelos votos dos ministros Rosa Maria Weber, Luiz Fux, José Antonio Dias Toffoli e Cármen Lúcia. Os ministros relator e revisor, Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski, respectivamente, já haviam votado também pela condenação dos dois, somando assim os seis votos e formando a maioria.
Por enquanto, os outros dois réus ligados ao Banco Rural, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório, ainda não tem os seis votos necessários para confirmar a condenação. Porém, nem todos os ministros votaram e o caso segue em julgamento a partir das 14h nesta quinta-feira (6). Votarão mais quatro ministros, na seguinte ordem: Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Carlos Ayres Britto, o presidente da Corte Suprema.
Samarane foi condenado por cinco ministros e Ayanna foi absolvida da acusação de gestão fraudulenta por cinco dos seis ministros que já leram seus votos. O único a pedir a condenação da ex-diretora, até agora, foi o relator Joaquim Barbosa.
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Weber destacou a intenção dos réus em simular os empréstimos do banco ao PT e as empresas de Marcos Valério. "As fraudes havidas no Rural não foram produto do acaso ou ações não intencionais, mas fruto de um agir criminoso deliberado", afirmou a ministra. Fux disse que o Banco Rural "serviu de uma verdadeira lavanderia de dinheiro para cometer um crime que não está previsto na lei e deveria ser classificado como gestão tenebrosa pelo risco que acarreta a gestão popular".
Toffoli afirmou que mesmo que Kátia Rabello e José Roberto Salgado tenham apenas autorizado renovações de empréstimos concedidas pelo então dirigente José Augusto Dumont morto por um acidente de carro em 2004 , "houve intenção livre e deliberada dos dirigentes de ocultar dos órgãos reguladores e fiscalizadores a real situação daqueles empréstimos, cujo inadimplemento era esperado".
A ministra Cármen Lúcia afirmou que os autos comprovam que houve simulacro de empréstimos. "Eu identifiquei a gestão fraudulenta (...) por meio de laudos, prova documental, prova testemunhal, todas as formas de provas, mostrando que houve o uso de ardis e de formas enganosas que não correspondia na sua forma o seu conteúdo", destacou.
Revisor
No início da tarde, o ministro revisor, Ricardo Lewandowski, votou pela absolvição de dois ex-dirigentes: Ayanna Tenório e Vinícius Samarane. Na segunda-feira (3), ele votou pela condenação de Kátia Rabello, ex-presidente da instituição, e José Roberto Salgado, ex-vice-presidente. O relator do processo, ministro Joaquim Barbosa, votou pela condenação dos quatro réus no item que se refere ao crime de gestão fraudulenta de instituição financeira imputado aos ex-dirigentes do Banco Rural.
Lewandowski disse que não vê em Ayanna e Samarane poderes de decisão sobre os empréstimos do banco ao PT e as empresas do publicitário Marcos Valério, supostamente fraudulentos. "Não fiquei convencido de que a ré Ayanna tenha agido de forma fraudulenta ou ardilosa na gestão da instituição financeira. Antes de ser contratada pelo Rural em 2004, ela jamais havia trabalhado em estabelecimento de crédito, de acordo com vários documentos", justificou.
Em relação a Samarane, Lewandowski afirmou que ele era apenas um funcionário na época do escândalo. "Ele era mero empregado do banco, sem poder de conceder empréstimo ou renová-los", disse. "Ele não era gestor e não podia ser agente do crime de gestão fraudulenta. "Não existe qualquer prova de que Vinicius teve participação ou tenha exibido qualquer dolo em sua conduta como empregado do Banco Rural."
Julgamento
Os ministros estão na segunda etapa do processo - são sete, no total -, que envolve 38 réus. O julgamento começou com 11 ministros, mas dez estão presentes, pois Cezar Peluso deixou a Corte ao se aposentar compulsoriamente na sexta-feira (31). Os principais pontos julgados no item de gestão fraudulenta de instituição financeira da ação são o fato de a direção do Banco Rural ter concedido empréstimos, como os de R$ 19 milhões à agência de publicidade SMP&B, de R$ 10 milhões à Graffiti Participações, ambas de propriedade do grupo de Marcos Valério, e crédito de R$ 3 milhões ao Partido dos Trabalhadores (PT).
Para o ministro-revisor, a prática do comando do Banco Rural descumpriu norma do Banco Central, desconsiderando os riscos das operações e as condições de garantia dadas pelos devedores. Segundo ele, as operações levavam ao "mascaramento do balanço do Banco Rural".
Lewandowski iniciou a leitura do voto, após o ministro-relator Joaquim Barbosa concluir sua parte. Barbosa votou pela condenação de Vinícius Samarane e Ayanna Tenório, além de Kátia Rabello e José Roberto Salgado, todos ex-dirigentes do Banco Rural.
O relator disse que o esquema envolvendo o Banco Rural dependia das ações fraudulentas dos dirigentes da instituição financeira. Barbosa acrescentou que os dirigentes do banco tentaram, por meio de aparência lícita, impedir suspeitas em relação aos empréstimos simulados.
O crime de gestão fraudulenta de instituição financeira, na Lei 7.492/1986, ao qual respondem os dirigentes do Banco Rural, prevê pena de três a 12 anos de reclusão, além do pagamento de multa.
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