Além do atraso inevitável na avalanche das delações da Odebrecht, a trágica morte do ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal (STF), na quinta-feira (19), traz impactos diretos para figuras centrais do jogo político de Brasília. O presidente da República, Michel Temer, e a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, têm a missão mais complexa: decisões de ambos serão cruciais para os rumos da Operação Lava Jato. Mas a morte do relator da maior investigação de combate à corrupção já realizada no país também mexe com outras autoridades.
Confira outros momentos que representaram desafios para a Lava Jato
O presidente da República, Michel Temer
Cabe ao presidente da República, Michel Temer (PMDB), indicar um novo nome para integrar o STF. Oficialmente, ele não tem um prazo para fazer a indicação. Mas, auxiliares do peemedebista já declararam que a intenção seria anunciar um substituto “o mais rápido possível”, inclusive porque o escolhido ainda enfrenta uma sabatina no Senado antes de efetivamente assumir a cadeira na Corte.
Como Teori era relator da Lava Jato, e o presidente Temer e aliados próximos são citados na investigação, o objetivo é evitar um desgaste, que certamente surgirá a qualquer sinal de postergação na escolha. A rapidez na decisão também evitará que as indicações dos aliados ganhem espaço, complicando ainda mais a situação do peemedebista.
Mas a escolha de um nome também não será uma tarefa fácil. Normalmente já monitorada, a indicação de um integrante para a máxima Corte do Judiciário agora será acompanhada de perto. O presidente Temer já está sendo publicamente cobrado para convidar alguém isento e técnico, duas características que o ministro Teori detinha, e que o ajudaram a conduzir os processos da Lava Jato.
A presidente do STF, Cármen Lúcia
Embora a indicação de um novo ministro seja uma prerrogativa exclusiva do presidente da República, a relatoria da Lava Jato pode não ser entregue ao nome escolhido por Michel Temer. Corre que a presidente do STF, a ministra Cármen Lúcia, poderia se socorrer de trechos do Regimento Interno para garantir a redistribuição do caso da Lava Jato entre integrantes que já atuam hoje na Corte. Esta hipótese é defendida pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
No Planalto, há inclusive quem defenda que o presidente Temer aguarde alguma manifestação da ministra antes de escolher o substituto de Teori. Sem o peso da Lava Jato, o peemedebista teria condições de escolher um nome “com calma”.
Mas a decisão de Cármen Lúcia também não é fácil: além da atitude flertar com o campo político - há quem não veja no caso específico a possibilidade de evocar o Regimento Interno -, uma redistribuição dos processos da Lava Jato poderia jogar o tema nas mãos de ministros com perfis mais questionáveis: Gilmar Mendes, por exemplo, é um notório crítico das gestões petistas. E Dias Toffoli foi advogado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas campanhas de 2002 e de 2006 e defendeu o petista perante a Corte.
Os senadores Renan Calheiros e Eunício Oliveira
Tanto o atual presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), quanto Eunício Oliveira (PMDB-CE), nome mais cotado para assumir o comando do Senado em fevereiro, estão na mira da Lava Jato, e podem assumir a condução de todo o processo de escolha, no âmbito do Legislativo, do novo magistrado do STF.
O substituto do ministro Teori, indicado pelo presidente Temer, é obrigado a passar por uma sabatina na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Na sequência, o nome ainda deve ser referendado pelo plenário da Casa, onde parte dos parlamentares também está implicada na Lava Jato.
A pressão mais forte, contudo, pode partir do atual chefe da Casa, que desde o ano passado já defende abertamente mudanças na legislação para inibir o que considera “abuso” das autoridades envolvidas na Lava Jato. Embora ainda não esteja completamente convencido, Renan Calheiros ainda pode ser indicado pela bancada do PMDB para o comando da CCJ, onde teria poder para ditar o ritmo do processo de escolha do novo ministro do STF.
O deputado cassado Eduardo Cunha
Há quase 100 dias preso no Paraná por causa da Lava Jato, o ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha (PMDB) também é atingido diretamente pela morte do ministro Teori, em função do atraso nas análises de eventuais delações.
Pessoas próximas do peemedebista têm indicado que ele não descartaria a tentativa de negociar um acordo de colaboração premiada com os investigadores da Lava Jato – procedimento que necessariamente passa pelas mãos do relator do caso no STF, na hipótese de citação a nomes com prerrogativa de foro.
A partir de agora, já se sabe que as delações da Odebrecht, por exemplo, naturalmente sofrerão atrasos. As confirmações dos depoimentos e possíveis homologações estavam inicialmente previstas para ocorrerem entre fevereiro e março.
Com a morte do ministro Teori, e a indefinição em torno de um substituto na relatoria da Lava Jato, o próprio desfecho das delações do caso Odebrecht ficou sem data. Na estimativa da Procuradoria Geral da República (PGR), haverá um atraso de pelo menos três meses.
Lula e o PT
No embate que a defesa do ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva protagoniza com o juiz federal Sergio Moro, relator da Lava Jato na primeira instância, a figura do ministro Teori tinha peso. Em março do ano passado, o relator no STF contestou de forma severa a decisão do juiz Moro que permitiu a divulgação do conteúdo das interceptações telefônicas da Lava Jato envolvendo Lula e a então presidente da República, Dilma Rousseff.
Até hoje, aquele episódio é tratado pelos petistas como o impulso decisivo para o impeachment, consolidado em agosto – a publicidade dada às conversas, acreditam petistas, minaram as chances de Lula ser nomeado para a Casa Civil, na “última cartada” da então presidente Dilma para salvar uma base aliada que se desmantelava no Congresso Nacional.
Desde então, a defesa do ex-presidente Lula passou a apostar fortemente no “contrapeso” do STF, especialmente do ministro Teori, embora também já tenha sofrido derrotas na Corte, em outras situações.
Na quinta-feira (19), advogados do petista se manifestaram com sentimento de pesar. Eugênio Aragão, ex-ministro da Justiça de Dilma Rousseff, afirmou, em nota, que o magistrado era “insubstituível”, “principalmente nestes tempos de decadência de hábitos da vida pública e de deterioração da cultura política e institucional”. Lula e Dilma, que indicou o ministro Teori para o STF no ano de 2012, também divulgaram notas lamentando o acidente.