O presidente Michel Temer e os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Renan Calheiros, anunciaram neste domingo (27) um acordo para barrar a anistia ao caixa 2, que vinha sendo discutida, pelos parlamentares, no bojo do pacote das dez medidas contra a corrupção. Temer disse que há unanimidade dos dirigentes do poder Executivo e Legislativo para atender a voz das ruas. “O poder é do povo”, disse, emendando que “quando o povo se manifesta, essa audiência há de ser tomada pelo Executivo e Legislativo”.
Na entrevista, Temer disse que “seria impossível não vetar uma matéria como a anistia ao caixa 2”. E que o anúncio feito neste domingo (27) pelos dirigentes da Câmara, Senado e por ele próprio “desestimula qualquer movimento para fazer essa matéria tramitar no Congresso Nacional”. E disse que não foi só agora que chegou a essa conclusão, citando que já havia saído em defesa dos movimentos de rua em 2013 – “desde que não houvesse depredações do patrimônio público” – e na sexta-feira passada lembrou que falou a interlocutores que seria impossível o presidente da República sancionar uma matéria dessa natureza (anistia ao caixa 2). “Acordamos, eu, Renan e Maia que não há a menor condição de levar adiante essa proposta”, reiterou.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, argumentou na coletiva que também já havia falado, desde a semana passada, que havia uma confusão de comunicação no debate sobre a anistia a crimes de caixa 2. “Nas discussões com os líderes, nossa intenção jamais foi anistiar crime. Óbvio que quando se fala em anistia, não se fala em crimes eleitorais, como foi feito no projeto de repatriação”, destacou. E repetiu: “O debate nunca aconteceu e não acontecerá no dia da votação das dez medidas contra a corrupção que vamos votar na terça-feira. Não estamos votando as dez medidas para anistiar crimes”, frisou Maia.
Renan Calheiros reiterou na entrevista coletiva que “há um acordo, um ajuste institucional no sentido de que não haverá apreciação de anistia a crime eleitoral, a caixa dois ou a outro qualquer crime”. Segundo ele, cabe ao Congresso fazer qualquer anistia, “tanto que acabamos de fazer uma de repatriação, mas para melhorar o caixa do tesouro nacional”, mas isso não ocorrerá com o caixa 2. E lembrou que tudo que sai do parlamento passa pelo crivo do presidente da República, que pode vetar ou sancionar. O presidente do Senado disse também que Temer e os dirigentes do parlamento concordam que a anistia ao caixa 2 não deve tramitar. “Temos outras prioridades para o Brasil. Estamos fazendo o ajuste fiscal e vamos votar matérias econômicas que são prioritárias para retomar o crescimento da economia.”
Na coletiva, Calheiros falou ainda que o Senado tem pauta fechada que não é a do seu presidente, numa referência às críticas que vem recebendo de setores do Judiciário. “Vamos dedicar toda nossa energia para votar essa pauta, como a lei orçamentária e outras pautas econômicas para retomar o crescimento do País.”
Resposta
Temer, Maia e Renan marcaram para o meio-dia deste domingo uma entrevista para a imprensa no Palácio do Planalto. A iniciativa visa dar uma mensagem de compromisso com o combate à corrupção num momento em que o próprio presidente da República enfrenta questionamentos éticos.
A expectativa é de que o texto seja votado na terça-feira (29) pela Câmara. A proposta do MPF é que o caixa 2, termo popular dado à prática de não contabilizar despesas de campanha, seja tipificado como crime. Mas, nos bastidores, líderes partidários vêm articulando mudanças na proposta para que o procedimento deixe de ser punido.
Após tratativas com Temer, Maia e Renan se comprometeram a conversar com os representantes das bancadas no Congresso e desmobilizá-los. O objetivo é que o assunto seja resolvido no Legislativo, para evitar que o presidente tenha de tratar do assunto ao sancionar o texto eventualmente aprovado pelo Congresso.
Inicialmente, Temer sinalizava que respeitaria a decisão do Legislativo a respeito do projeto. Agora, porém, o entendimento é que o cenário é outro, pois o presidente ficou politicamente fragilizado após ser acusado pelo ex-ministro da Cultura Marcelo Calero de “enquadrá-lo” para ver atendidos interesses pessoais do então chefe da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, que deixou o cargo na sexta-feira, em meio ao escândalo sobre o caso.
“O Senado não vai votar qualquer projeto que envolva eventuais anistias de campanhas eleitorais, poupando o senhor presidente da República de veto ou sanção sobre matérias dessa natureza”, avisou Renan em nota distribuída à imprensa no sábado (26).
Maia e o secretário do Programa de Parceria de Investimentos, Moreira Franco, se reuniram no sábado por mais de três horas com Temer no Palácio do Jaburu. “Na Câmara, vamos organizar essa votação das dez medidas, com a clareza de que ninguém vai votar nenhuma forma de anistia”, disse Maia na saída do encontro, acrescentando que, se há posição nesse sentido na Casa, ela não é “majoritária”.
O presidente da Câmara assegurou compromisso de que “não haverá nada” que venha a isentar políticos de “nenhum tipo de crime”. “Não haverá nenhum texto que vá anistiar ninguém de corrupção ativa ou passiva ou peculato ou lavagem”, acrescentou.
Ele disse que, caso seja apresentada emenda, terá de ser votada a proposta que prevê sanções a juízes e integrantes do Ministério Público por abuso de autoridades. Mas ponderou que a votação das dez medidas não é “o ambiente adequado”. “Talvez seja até inconstitucional esse encaminhamento por projeto de lei.”
Maia disse também que, entre as prioridades, estão a reforma da Previdência e o projeto que trata do pente-fino no INSS. Este último, segundo ele, “é importante porque no ano que vem vai gerar uma economia da ordem de R$ 7 bilhões”
Absurdo
Maia afirmou ser “um absurdo” a possibilidade de Calero ter gravado conversas com Temer e afirmou que o ex-ministro da Cultura deve ter cometido “várias infrações”. “É um absurdo você gravar um presidente da República. Não faz nenhum sentido o que o ex-ministro fez. Ele não teria nenhuma obrigação de acatar nenhum pedido do outro ministro. Poderia desde o início ter cortado esse negócio”, declarou. Questionado se Temer sabia dos interesses de Geddel no prédio, reagiu: “Não sou porta-voz do governo”.
Calero pediu demissão acusando o então ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, que deixou o cargo na sexta-feira, de pressioná-lo para ver atendidos interesses pessoais. Geddel queria que o Instituto Nacional do Patrimônio Histórico e Artístico (Iphan), órgão subordinado à Cultura, retirasse o embargo à obra de uma torre de apartamentos em Salvador, no qual comprou apartamento.
Em depoimento à Polícia Federal, o ex-ministro da Cultura afirmou que levou o caso a Temer e o presidente o pressionou a encontrar uma solução para o projeto imobiliário. Calero gravou conversas com integrantes do governo, mas ainda não confirmou publicamente se há áudios do presidente.