Os argentinos deixaram de lado a melancolia do tango e esqueceram os últimos tropeços da seleção na Copa do Mundo. O país se animou desde que Jorge Bergoglio foi anunciado papa. Nas ruas de Buenos Aires, alegria e orgulho envolvem a população e deixam, pelo menos por alguns momentos, a crise financeira em segundo plano. Bandeiras do Vaticano e do país ornamentam fachadas, janelas e o Obelisco da Praça da República, no coração da cidade. "Deus é argentino e o papa também", dizem em bom tom os portenhos.

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A Praça de Maio, local de manifestações políticas, passou a ser referência católica. Em frente dela ficam a Catedral de Buenos Aires e a Cúria, onde Jorge Bergoglio vivia. A igreja, que já fazia parte do roteiro turístico da cidade, agora tornou-se parada obrigatória. Na entrada, turistas vindos de todas as partes do mundo disputam espaço para tirar uma foto ao lado de uma pequena imagem do papa Francisco. "Estamos vivendo um grande momento", diz o argentino Luciano Arborelo, 32 anos. De passagem pela capital portenha, ele diz não ser católico, mas fez questão de registrar a visita à catedral.

O comércio não deixa a oportunidade passar. Broches, camisetas, ímãs de geladeira e todo tipo de suvenir com a imagem do papa Francisco se multiplicam. Frases criativas, ou não, acompanham os brindes. "Venho do fim do mundo"; "As mãos de Deus são argentinas". Na sexta-feira, dia 15 de março, o diário Clarín, um dos mais importantes do país, brindou os leitores com um pôster colorido no qual aparece a imagem de Bergoglio e a bandeira argentina ao fundo.

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O "momento papa" vivenciado pelos argentinos soa como um prêmio, diz o escritor argentino Andrew Graham-Yooll, autor de livros sobre a realidade latinoamericana. Para ele, é como se o país ganhasse um campeonato. "Há um otimismo muito grande". Segundo ele, a figura do sumo pontífice vem se juntar a outros três ícones do país: Maradona, Messi e a princesa Máxima Zorreguieta, da Holanda que confirmou presença na primeira missa pública do papa Francisco.

Graham-Yooll, no entanto, é cauteloso ao afirmar que Francisco poderá representar uma efetiva mudança na vida dos argentinos onde hoje é preciso desembolsar P$ 8,05 para comprar US$ 1. "O papa estará em Roma e se envolverá com os problemas do Vaticano", acredita.

Para o colunista Jorge Castro, a escolha de Bergoglio para ser papa desencadeou uma onda de otimismo no país e representa um impacto enorme para a Argentina. "Foi extremamente importante, porque a Argentina retoma sua identidade como nação", declara. Os argentinos, segundo Castro, são muito críticos de si mesmos e do país, por isso, a figura do papa se torna importante. Na avaliação dele, hoje a Argentina está profundamente dividida por questões políticas e Francisco, a longo prazo, pode trazer de volta a união.

Missa

Manifestações de admiração pelo homem que hoje comanda a Igreja Católica no mundo vão se estender pela Argentina nos próximos dias. A primeira missa rezada pelo papa será transmitida na Praça de Maio em uma tela gigante, na próxima terça-feira, a partir das 5h30 da manhã.

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PolíticaPeronistas defensores do papa são contra políticas de Cristina Kirchner

A relação instável entre Jorge Mario Bergoglio e a presidente Cristina Kirchner não passou em branco entre os fiéis. Simpatizantes do papa, conhecido por ser peronista, espalharam pela capital portenha cartazes onde aparecem a imagem acompanhada da frase: "Francisco I. Argentino e Peronista".

Alguns cartazes foram rasgados, outros resistem. Os peronistas que defendem o papa são contrários à política de Cristina (também peronista) e não se consideram kirchneristas. Eles tecem duras críticas a atual presidente. Alguns, sequer, querem se referir ao nome de Cristina quando falam dela. "Francisco é uma figura mais importante do que aquela que está sentada lá [apontando para a Casa Rosada, sede presidencial]", critica o comissário de bordo José Schirripa, 36 anos.

A aposentada Helena Sara, 67 anos, apareceu com a bandeira argentina em frente à catedral cantando uma música em latim para homenagear o papa Francisco. Católica fervorosa, ela disse que já viu Jorge Bergoglio tirar dinheiro do bolso para dar a um indigente, mas nunca viu Cristina cruzar a Praça de Maio.

Dividida politicamente, a Argentina tem partidários a favor e contra Cristina Kirchner. Os que simpatizam com o governo defendem o que chamam de avanço social, e dizem que o país está mais justo. Os críticos reclamam da falta de liberdade – há uma série de exigências até para se comprar dólar –, da insegurança e do excesso de subsídios públicos concedidos à população. "Aqui não nos deixam mais viver e respirar", diz o taxista Roberto Zamora.

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