A recusa do Senado em cumprir a liminar afastando Renan Calheiros (PMDB-AL) da presidência da Casa engrossa ainda mais o caldo de instabilidade política e econômica no Brasil. As análises apontam que, sem um pacto para manter a governabilidade e sem alguma resposta rápida para fazer frente à recessão, o governo federal não terá condições de promover as reformas de ajuste fiscal e corre o risco de não ficar em pé até 2018.
Além disso, a batalha entre Legislativo e Judiciário pode desencadear novos problemas. Caso o Senado marque sessões para esta quarta-feira (7), antes de o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) analisar a liminar concedida por Marco Aurélio Mello, o Senado pode vir a ser questionado pelas votações realizadas.
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Outro fator a considerar é a postura dos ministros do STF frente à desobediência do Senado à decisão proferida na segunda à noite. No começo de novembro, a maioria dos ministros já firmou entendimento de que um réu – como Renan Calheiros – não pode estar na linha sucessória da Presidência da República.
“Instabilidade é desrespeitar a Constituição”, diz ex-juiz
O precursor do movimento que culminou com a Lei da Ficha Limpa, o ex-juiz Márlon Reis, hoje advogado, diz que a decisão liminar afastando Renan Calheiros da presidência do Senado não é motivo para causar instabilidade política. “A maior fonte de instabilidade no país é o seguido descumprimento das normas constitucionais”, afirma.
Reis foi, junto com o jurista Luiz Flávio Gomes, autor da tese jurídica pelo afastamento de réus da linha sucessória da Presidência da República. “Fizemos uma análise abstrata da Constituição, sem pensar em atingir diretamente um ou outro político. Pelo momento em que o país vive, a decisão causa perplexidade, mas é apenas uma instituição cumprindo com seu dever”, afirma Reis.
Para o advogado, a decisão de Marco Aurélio Mello é acertada. “Renan não tem o privilégio de garantir a estabilidade do Brasil. As leis estão aí para serem aplicadas, e a liminar mostra que ninguém está acima da lei”, acrescenta.
“Há críticas quanto à liminar de Marco Aurélio, mas não em relação ao mérito. Acho difícil o Supremo reverter a decisão, pois isso seria contrário ao que a maioria já concordou”, avalia o advogado Márlon Reis, ex-juiz e precursor da Lei da Ficha Limpa.
Antes de o Senado desafiar o Supremo, os prognósticos já eram bastante pessimistas. Na terça-feira (6) pela manhã, boletim da consultoria Gradual Investimentos indicava que, sem Renan, a votação em segundo turno da proposta de limitar os gastos públicos (PEC 55) ficaria inviabilizada e só retornaria ao plenário em fevereiro, após eleição para a presidência da Casa.
“É nossa visão que a capacidade de articular politicamente o Congresso para aprovar – além da PEC 55 – uma reforma da Previdência ampla está muito baixa. Alguns analistas políticos já apontam como baixa a capacidade do governo em se manter de pé até o final do seu mandato em 2018”, diz boletim assinado pelo economista-chefe da Gradual, André Guilherme Perfeito.
Para o cientista político Geraldo Tadeu Monteiro, professor no Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj), um dos principais ingredientes da instabilidade é a falta de posicionamento do Executivo. “As crises se retroalimentam. A economia não melhora pelo cenário político, e com a economia ruim, as finanças do estado e do país pioram, prejudicando ainda mais o cenário político. Temer colocou Henrique Meirelles na Fazenda, achando que isso geraria otimismo, mas faltou apontar uma diretriz, um caminho para a economia se recuperar”, avalia.
Monteiro acrescenta que um dos trunfos de Temer – a força da base aliada no Congresso – é também um de seus defeitos. “O governo fica muito preso ao jogo político de nomeações e interesses do Congresso. Em vários temas relevantes, diz que não vai se manifestar, que cabe aos parlamentares decidirem. Colocando a Lava Jato entre os ingredientes, com expectativa de envolver um enorme contingente de políticos, o bolo azeda de vez”, acrescenta.
Em boletim semanal divulgado na segunda-feira, a consultoria Rosenberg já dizia que o governo federal poderia ser engolido pela crise política se não agisse logo. O encaminhamento da reforma da Previdência atende a esse pleito do mercado financeiro, mas mexe nos direitos de trabalhadores em um momento de grande engajamento. “A partir das manifestações de 2013, a população percebeu que poderia interferir nos rumos da política saindo às ruas”, destaca Monteiro.
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