Os agentes penitenciários que viram a cara da morte
A faca artesanal era pressionada com força contra o pescoço do agente penitenciário Robson*. Por trás dele, dezenas de detentos rebelados e que haviam ganhado o telhado da Penitenciária Estadual de Piraquara II (PEP II) gritavam aos policiais e autoridades. O refém ouvia as ameaças com frieza, mas não sem suar frio. Nas 26 horas que durou a rebelião entre os dias 12 e 13 de setembro ele ficou em poder dos presos. Por cinco vezes foi exposto na cobertura da prisão e ameaçado com as armas artesanais.
Terminou após mais de 48 horas a rebelião na Penitenciária Industrial de Guarapuava (PIG), Centro-Sul do Paraná. às 9 horas foi fechado um acordo que envolveu a transferência de 31 detentos, sendo 29 para outros presídios paranaenses e dois para outros estados. Por volta do meio-dia, todas as transferências já tinham sido feitas e todos os reféns - 10 agentes penitenciários e outros presos condenados por crimes sexuais - foram liberados. As informações foram repassadas pela Secretaria de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos (Seju).
A soltura dos agentes ocorreu cerca de duas horas depois do fim das negociações entre a a Polícia Militar (PM) e os presos rebelados. O motim na unidade começou às 11h30 de segunda-feira (13), quando cerca de 40 presos se deslocavam para o canteiro de trabalho, dentro da própria unidade, e aproveitaram a oportunidade para render 13 agentes.
Em 2014, esta é a 21ª rebelião que ocorre nos presídios do Paraná; veja lista.
Veja fotos da rebelião na Penitenciária Industrial de Guarapuava
Sem ferimentos físicos graves, alguns dos agentes deixaram a unidade de maca. O restante saiu andando, sob aplausos de familiares que aguardavam ao lado de fora da PIG. Segundo o Sindicato dos Agentes Penitenciários do Paraná (Sindarspen), todos os trabalhadores foram encaminhados ao hospital.
"Finalmente, depois de mais de 48 horas, acabou. Até quando os agentes vão ter que viver esse pesadelo?", declarou, aos jornalistas, a vice-presidente do sindicato Petruska Niclevisk Sviercoski. "Não dá mais para prorrogar o cumprimento de melhores condições de trabalho", acrescentou.
Com a saída dos agentes e a promessa de rendição dos presos, a Polícia Militar - que atuou diretamente nas negociações - entrou na penitenciária.
Acordo
Policiais militares que negociavam diretamente com os presos rebelados na Penitenciária Industrial de Guarapuava conseguiram fechar um acordo para acabar com a rebelião na unidade por volta das 9h30 desta quarta. A Seju informou, por volta das 9h35, que os presos "cederam" o fim dos atos de revolta em troca da remoção de 28 detentos do local.
Conforme a secretaria, ainda não há uma definição sobre o destino dos detentos que serão transferidos. Assim que o acordo foi fechado, sabia-se apenas que as remoções seriam feitas para, pelo menos, um outro estado. Na terça-feira (15), a Polícia Militar (PM) havia informado que presos exigiam transferências para Santa Catarina, o que não foi confirmado pela Seju.
Com as negociações concluídas, os cerca de 40 presos que comandam a revolta deixaram o telhado prédio da unidade, onde permaneceram durante todo o motim. Eles também tiraram o refém que era mantido amarrado ao para-raios do prédio. Por este "esquema" passaram vários reféns.
Em entrevista, o 1º Tenente Fábio Zarpelon, porta-voz da PM durante a rebelião, acrescentou que, além das transferências, autoridades que atuam na pasta de segurança pública se comprometeram a realizar melhorias no presídio. As outras duas reivindicações dos presos troca na direção e a análise de progressão de pena para quem teria direito não foram aceitas.
Nesta tarde, uma nova entrevista será concedida pela PM para detalhar as exigências feitas pelos presos, bem como a atual situação no interior do presídio.
Reféns
Uma suposta liberação de um agente penitenciário, por volta das 20h30 desta quarta-feira, foi anunciada pela Seju. A soltura, contudo, não foi confirmada pela PM e o Sindarspen, o que manteve a relação de dez trabalhadores sob mira dos rebelados até que todos fossem liberados.
Além dos agentes, entre cinco e seis presos que cumprem pena por crimes sexuais continuam reféns.
Reféns libertados
Antes da libertação de todos os dez agentes restantes, três deles já haviam sido liberados pelos presos. A última destas ocorreu por volta das 17h30 desta terça-feira. O trabalhador chegou a permanecer no teto da PIG com uma corda envolta em seu pescoço, e foi encaminhado a uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) assim que deixou a unidade. Apesar da situação a que foi exposto, ele passa bem.
Também nesta terça, um agente foi solto em troca da garantia de almoço para os presos. Segundo o 1º Tenente Fábio Zarpelon, o trabalhador sofre de hipertensão arterial e diabetes. Quando começou a revolta - às 11h30 de segunda-feira (13) - 13 agentes foram rendidos pelos presos.
O primeiro foi solto ainda na tarde de segunda, depois de ter sido queimado com cola quente. Alguns dos presos permitiram a retirada do trabalhador para que ele fosse encaminhado a uma unidade médica. Esse mesmo agente voltou à unidade nesta manhã, temendo pela vida dos companheiros. Ele acompanhou a situação do lado de fora da PIG na terça e não quis falar com a imprensa, por estar muito abalado.
Tensão marca segundo dia do motim
Além do terceiro agente solto, que teve a corda envolta em seu pescoço, outros dois reféns foram levados ao teto da penitenciária por volta de 16h30 desta terça. Um foi amarrado ao para-raios e teve o corpo envolvido com um colchão. O outro, que estava apenas de cueca, apanhou bastante.
Primeiro dia da revolta
Agentes do Batalhão de Operações Especiais (Bope), da PM, iniciaram as negociações por volta das 17 horas de segunda-feira. Durante as conversas, treze reféns foram jogados do telhado da unidade com as mãos amarradas. Todos sofreram apenas ferimentos leves e passam bem, conforme a Seju. O Sindarspen, no entanto, informou que um dos presos teve traumatismo craniano após ser jogado do telhado, segundo informações do Serviço de Atendimento Móvel de Emergência (Samu).
Também no primeiro dia de rebelião uma grande quantidade de fumaça pôde ser observada saindo da PIG. Nesta terça, o Sindarspen disse que a fábrica da unidade foi queimada. No espaço eram produzidas botinas e luvas para uso de proteção individual. A parede da parte de trás do recinto onde ficava a fábrica chegou a rachar. A Seju confirmou o fato, mas disse que o incêndio atingiu apenas um dos dois canteiros de trabalho existentes na unidade.
Sem ligação com facções criminosas
O motim toma conta das cinco galerias que compõem a penitenciária. No local, estão dez presos que participaram da rebelião na Penitenciária Estadual de Cascavel, no fim de agosto, que terminou com cinco mortos. A PM descartou, inicialmente, o comando da revolta por esses presos ou por detentos ligados a facções criminosas. A unidade de regime semiaberto, que fica ao lado da penitenciária, não foi afetada pelo motim.
Rebelião em Guarapuava é a 21ª do ano; veja lista das outras 20
5 de janeiro de 2014 - Dezoito presos se amotinaram na Penitenciária Central do Estado (PCE), em Piraquara. Durante uma hora eles negociaram transferência para o interior do estado. Um agente foi mantido refém pelos presos.
09 de janeiro de 2014 - Um agente penitenciário foi mantido refém por presos da Penitenciária Estadual de Piraquara II (PEP II), na Região Metropolitana de Curitiba. Os presos pediam transferência para penitenciárias de Foz do Iguaçu, no Oeste do Paraná.
15 de janeiro de 2014 - Após três horas de motim, presas do Centro de Regime Semiaberto Feminino (Craf) de Curitiba libertaram duas agentes penitenciárias que foram feitas reféns. As detentas pediam melhorias em higiene e limpeza, além de tratamento semelhante ao que ocorre na Colônia Penal Agrícola (CPA), em Piraquara.
16 de janeiro de 2014 - Um agente penitenciário foi mantido refém durante 16 horas na PCE, em Piraquara. Os presos pediam transferências para Londrina, Maringá e Foz do Iguaçu.
10 de fevereiro de 2014 - Vinte e quatro presos, que pediam transferência para outros presídios do estado, mantiveram um agente penitenciário como refém na PEP II. O agente foi libertado após cinco horas de negociações.
06 de março de 2014 - Presos que reivindicavam transferências para Londrina e Francisco Beltrão mantiveram por 15 horas dois agentes penitenciários como reféns na PEP I. As negociações duraram poucas horas, mas os presos se recusaram a viajar de noite, o que fez com que o motim terminasse somente após 15 horas.
10 de março de 2014 - Na PEP II, durante quatro horas um agente penitenciário ficou nas mãos de seis presos que pediam transferências para Guarapuava. Os presos foram transferidos e o agente liberado após negociação.
19 de março de 2014 - Dois agentes carcerários que escoltavam presos foram dominados pelos detentos na PEP I. Os presos libertaram os agentes após conseguirem transferência para cidades de origem. Foram 15 horas de negociação.
19 de março de 2014 - Também na PEP I, durante uma hora um agente foi dominado por presos que pediram transferência para Maringá, no Noroeste do Paraná.
16 de abril de 2014 - No Presídio Hildebrando de Souza, em Ponta Grossa, nos Campos Gerais, foram oito horas de negociação até que os detentos libertaram um agente penitenciário. Os motivos da rebelião não foram informados, mas o presídio sofre com falta de vagas.
01 de maio de 2014 - Em Santo Antônio da Platina, no Norte Pioneiro, presos da Cadeia Pública do município se rebelaram e pediram transferência. Alguns deles foram colocados em liberdade, pois já haviam cumprido pena.
14 de julho de 2014 - Três agentes carcerários foram feitos reféns na cadeia pública de Telêmaco Borba. O motim durou cerca de 17 horas. Antes do motim, houve tentativa de fuga.
17 de julho de 2014 - Por 16 horas, presos da PEP II realizaram um motim. Quatro presos pediam transferência para Londrina. Um agente na penitenciária foi mantido sob domínio dos presos.
22 de julho de 2014 - Quatro presos se rebelaram e mantiveram um agente refém na PCE. Eles pediam transferência para outras unidades prisionais do Complexo Penitenciário de Piraquara (CCP).
22 de julho de 2014 - Na Penitenciária Estadual de Foz do Iguaçu I (PEF I), no Oeste do Paraná, dois agentes foram mantidos sob domínio de dezesseis presos por seis horas. A exigência também era de transferência para outras unidades prisionais do estado.
24 de agosto - Na Penitenciária Estadual de Cascavel (PEC), dois agentes penitenciários foram mantidos reféns por cerca de 45 horas. Cinco pessoas morreram no motim e outras 25 ficaram feridas no motim mais violento do Paraná dos últimos quatro anos.
9 de setembro - três agentes penitenciários foram mantidos como reféns por um grupo de 14 presos na cadeia pública de Guarapuava, na região Centro-Sul do Paraná. Os detidos concordaram em liberar os funcionários da prisão depois de acertar a transferência de 74 presos para outras penitenciárias do estado. O motim terminou sem feridos nem mortos.
10 de setembro - 77 presos foram transferidos da Penitenciária Estadual de Cruzeiro do Oeste (PECO), no Noroeste do Paraná, depois de um motim de 18 horas. Foram 13 reféns, sendo 12 presos e um agente penitenciário.
12 de setembro - presos do bloco 3 da Penitenciária Estadual de Piraquara II (PEP II), na Região Metropolitana de Curitiba, mantiveram dois agentes penitenciários reféns por 25 horas. Após o acerto de transferências, agentes e presos que também eram mantidos reféns foram liberados e ninguém ficou ferido.
16 de setembro - um segundo motim ocorreu em um intervalo de menos de uma semana na Penitenciária Estadual de Piraquara II (PEP II). Dois agentes penitenciários foram feitos reféns durante mais de 30 horas, período em que a rebelião perdurou. O principal motivo da revolta era o medo que os presos rebelados têm de detentos de uma facção rival. Ninguém ficou ferido.
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